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sexta-feira, 24 de maio de 2019

Entrevista de Domingos Soares de Oliveira






O Benfica precisa de vender jogadores ou os atletas só saem com a cláusula de rescisão?

São duas perguntas que não estão ligadas entre si. O Benfica tem hoje uma situação económica muito mais robusta do que já teve no passado, mas mesmo assim a venda de jogadores continua a fazer parte do negócio. Não significa que tenham de ser jogadores titulares, nós este ano sinalizamos aquilo que foram as vendas do Benfica ao longo do ano, não houve nenhum titular que tivesse saído e, no entanto, temos um volume de negócios com venda de jogadores ainda significativo.

Portanto, se aparecer um clube que dê 100 milhões de euros pelo João Félix, o Benfica não vende?

Se aparecer um clube que não bata a cláusula a intenção é não vender.

O que é que determina a decisão definitiva de venda ou não abaixo da cláusula de rescisão? Faz sentido, para a realidade económica e financeira em Portugal e do Benfica, haver uma oferta de 100 milhões de euros e não vender um jogador de futebol?

Sei que é difícil as pessoas entenderem isto, 100 milhões de euros é muito dinheiro. Nunca houve vendas de 100 milhões de euros de um único jogador em Portugal. Agora, o nosso objetivo principal, à data de hoje, é ganhar no relvado. Tudo o que tivermos de fazer para manter os jogadores que nos permitam ter mais condições de ganhar no relvado vamos fazê-lo. Já houve anos, há alguns anos, em que a situação económica era mais débil e, portanto, a necessidade de vender os jogadores que eram titulares era uma necessidade efetiva. Hoje, a situação é diferente. Portanto, se a cláusula de rescisão é de 120 milhões, se não aparecer ninguém a bater a cláusula de 120, que batam 100 ou 90 ou 80, o jogador fica.

Já houve algum clube a apresentar uma oferta concreta ao Benfica por João Félix?

Não chegou nenhuma oferta ao Benfica. Há conversas, há rumores, há algumas informações que até temos por via do jornal, de clubes que estão interessados. É verdade que, nas reuniões internacionais, a grande maioria dos clubes mais importantes da Europa pergunta pelo João Félix, todos têm uma expectativa relativamente ao João Félix, mas do ponto de vista objetivo, até à data, não chegou nenhuma proposta ao Benfica.

50 ou 60 milhões é já uma parte muito significativa do orçamento, por exemplo do orçamento que o Benfica está agora a executar e que termina no final do junho…

Estamos a fechar o exercício do ano, vamos fechar o exercício sem vendas de jogadores com um valor próximo de 200 milhões de euros. Sem receitas operacionais, sem qualquer transação de jogadores. E com transações de jogadores, se não houver nenhuma surpresa até ao final do ano, ou seja, se não houver nenhuma venda relevante, o valor deve ser 250 ou 280 milhões de euros. Se considerarmos que 50 milhões – este ano é cerca de 58 milhões de euros – vem das competições europeias… As competições europeias, à semelhança dos direitos televisivos, são as duas principais componentes do ponto de vista das receitas. E são one shot, ou seja, ou estou ou não estou. Não é venda de merchandising, não é venda de bilhética que é um trabalho diário. Aqui, ou se conseguiu ou não se conseguiu.

Sobre o naming do estádio, vamos ter novidades em janeiro ou fevereiro do próximo ano?

Não sei se vamos ter. Temos propostas… acredito que existem condições para fechar essas propostas durante os próximos meses, mas sou sempre cauteloso porque não queremos criar falsas expectativas.

É possível dar uma noção de valores?

Temos sempre apontado para um valor de cinco milhões de euros por ano. Estes contratos têm de ser de longa duração, a oito ou a dez anos.

Disse que começa esta época mais confortável. Quer dizer que o Benfica vai gastar mais? Recordo dois pontos, na emissão de obrigações assumiu o compromisso de aumentar os capitais próprios do Benfica e conter os gastos operacionais, isto é, não inflacionar orçamentos, nomeadamente com salários de jogadores. Como é que isso é compatível para ter uma equipa competitiva?

As receitas no mundo do desporto crescem sempre, não para todos os clubes, mas para a maioria e é o nosso caso. Este ano, temos um crescimento de receitas operacionais de 25%, e é uma época em que não fizemos nada de espetacular em termos de competições europeias porque saímos da Champions e fizemos depois até aos quartos de final na Liga Europa. Existe uma tendência neste momento no mundo do futebol que é de permanente crescimento das receitas. Na maior parte dos casos, temos receitas que estão de alguma forma contidas. Por exemplo, o contrato de direitos televisivos está fechado para os próximos anos, mas do ponto de vista de receita de bilhética, à medida que vai havendo maior escassez do ponto de vista de disponibilidade, e este ano já tivemos oito jogos em que não tínhamos mais bilhetes para vender. Naturalmente o produto mais escasso permite-nos crescer o valor, isto é válido para empresas e é valido para os particulares.

No caso das competições europeias aquilo que se nota é que de ano para ano as receitas sobem significativamente. Não é de ano para ano, mas nos ciclos 2018/2021 e agora 2021/2024. Há sempre um crescimento de receitas. Portanto, contenção de custos operacionais sim, desde que isso não ponha em causa a qualidade do plantel e desde que isso seja acompanhado de um crescimento das receitas como temos tido.

Uma futura Liga Europeia seria bem-recebida no sentido de mais facilmente poder aumentar as despesas porque as receitas serão muito maiores?

Uma futura Liga Europeia, seja ela fechada ou não — porque, no fundo falou-se durante muitos anos numa Super Liga e agora fala-se de uma competição diferente, com muitos mais jogos europeus, mas que não é uma competição fechada –, é um modelo para equipas como o Benfica e, provavelmente, para outras equipas com o estatuto do Benfica, é um modelo favorável. Naturalmente que, se em vez de seis jogos, numa fase de grupos disputamos 14, o incremento de receitas é um incremento significativo.

Um desafio que se coloca é: como é que o Benfica garante estar nesse patamar das melhores 32 equipas europeias? Até agora, do ponto de vista de ranking, estamos nesse patamar e até já estivemos melhor. Do ponto de vista de receitas também. Temos conseguido aguentar-nos dentro dos 30 maiores, mesmo com os crescimentos disparatados do valor dos direitos televisivos em Inglaterra, nós conseguimos manter-nos ali dentro dos 25/30 primeiros.

E é fulcral estar nesse espaço de referência europeu para poder manter a hegemonia do futebol português?

É fulcral estar no espaço europeu, sem dúvida. E penso que o nosso projeto tem de ser um projeto em que olhamos para os nossos concorrentes como os clubes que estão ao nível mais alto da Europa.

Mas é fulcral estar nos oitavos de final?

É fulcral estar nos oitavos de final e, a partir do momento em que se entra nos oitavos de final, qualquer coisa pode acontecer. É verdade que o último clube a vencer uma Champions, no modelo atual, que não fosse a união dos cinco grandes países, foi o FC Porto em 2004.

O Benfica acabou de fazer uma emissão de obrigações que correu muito bem. Tendo em conta o quadro que nos traça, porque é que ao mesmo tempo o Benfica teve de antecipar receitas dos direitos televisivos da NOS de 2022 e 2023?

Mais uma vez, as coisas não são coincidentes. Ou seja, primeiro fizemos essa cedência de créditos da NOS para reembolsar os 50 milhões que tinham origem num anterior empréstimo obrigacionista. Portanto, ao contrário de outras operações, em que o reembolso só era feito depois da emissão, neste caso fizemos primeiro o reembolso e depois lançamos a nova emissão, portanto, reembolsamos esses 50 milhões.

De alguma forma estenderam o pagamento dessa dívida aos obrigacionistas, a quem investiu. Está a valer a pena, mesmo com taxas baixas, mas, ainda assim, mais altas do que as da banca, trocar a dívida bancária por este tipo de dívida de obrigações?

Nós praticamente já não temos dívida bancária. A nossa dívida bancária é de cerca de 13/14 milhões de euros, não ultrapassa isso. O maior problema que existe em termos de dívida bancária em Portugal é que os bancos não financiam as sociedades anónimas desportivas, dizem, por regras…

Não é por vontade dos clubes…

Não. Nós gostaríamos muito de poder continuar a trabalhar com a banca, mas desde 2014 as regras têm sido mais apertadas e, do nosso lado, fizemos o reembolso de toda a dívida que tínhamos à banca, que não era só uma dívida do produto típico de empréstimo, mas também de papel comercial. Portanto, havia uma série de instrumentos financeiros que tinham taxas mais altas do que as habituais. Fizemos esse reembolso todo, com financiamento de 3,75% que eu acredito que se possa manter para os próximos. Estamos numa situação já bastante confortável.

Nos últimos anos, sucederam-se vários casos que envolveram o Benfica, nomeadamente e-toupeira e suspeitas sobre jogadores. A vitória deste ano é justa?

Não tenho dúvidas nenhumas. É uma vitória justíssima e os números falam por si. Tivemos um início de campeonato difícil, em que por culpa própria tivemos resultados menos positivos. E depois, a partir da entrada do Bruno Lage, fizemos um campeonato absolutamente irrepreensível. Acho que ninguém põe em causa isso.

Há quem ponha isso em causa, por exemplo num conjunto de resultados que foram consequência direta de erros de arbitragens.

Sempre ouvi dizer que o campeonato é uma prova de resistência e acho que é verdade. Um campeonato não se decide pelo jogo A ou B, pode haver um erro no jogo A a nosso favor e outro erro no jogo B a favor do nosso adversário. O que é verdade é que nas lutas diretamente com os nossos principais rivais, ganhámos essas lutas praticamente todas.

No ponto de vista de eficácia e ataque, demonstrámos que voltamos quase aos anos 60/70. Portanto, sinceramente, uma pessoa honesta não põe em causa o resultado deste campeonato, porque — eu sei que é desagradável para os nossos adversários –, mas ver a performance que tivemos e ver que conseguimos ultrapassar uma barreira que parecia inultrapassável — sei que é difícil e compreendo isso, já estive do outro lado –, mas é um campeonato irrepreensível.

A Benfica TV vai continuar a transmitir os jogos do Benfica no próximo ano?

Essa decisão não é só do Benfica, mas, acima de tudo, de quem nos comprou os direitos televisivos. E quem nos comprou — foi a NOS — partilha esse conteúdo e custos com restantes operadores de telecomunicações. Os operadores estão satisfeitos com o modelo que têm atualmente, do ponto de vista prático, quem assinar a TV contribui para o esforço que os operadores de telecomunicações fazem e, portanto, da parte dos operadores e daquilo que nos foi transmitido recentemente, existe todo o interesse em manter o modelo atual. Da nossa parte, obviamente, completamente disponíveis para manter o modelo atual, estamos satisfeitos com ele e é para continuar.




Acho muito importante todos estarem a par daquilo que o principal administrador da Benfica SAD na área financeira tem a dizer. 

Para mim duas coisas a salientar: cai por terra a ideia de que os jogadores só sairão pela cláusula de rescisão. Quem souber ler aquilo que DSO diz perceberá porque digo isto. Outra coisa que me salta à vista é os 5 milhões de euros pelo naming do Estádio, caindo por terra toda a demagogia barata de jornais a dizer que o patamar era os 10M€ / ano.

Muito interessante a forma como fala das receitas e da ideia de uma Liga Europeia. 

E-goi