"É uma pena. Uma perda. Mesmo, não estou a brincar. Dava gosto ver
Jorge Jesus quando chegou ao Benfica: a pastilha marota mastigada de
boca aberta, o cabelo revolto com madeixas ainda pouco definidas, as
rugas rudes, marcadas e agrestes, a roupa mal amanhada. E as corridas
desconcertantes, os palavrões e os insultos aos jogadores durante os
jogos? Lembram-se? O Cardozo falhava um golo de baliza aberta e Jesus
explodia; o Di Maria punha-se a inventar mais do que devia e era posto
na ordem; o Aimar – sim, até o Aimar – não corria como os outros e Jesus
mostrava-lhe furiosamente como se fazia ao longo da linha lateral. Ele
espumava com o jogo. E os adeptos, numa espécie de orgia salivar,
espumavam consigo.
Para os benfiquistas, aquele homem estranho
e egocêntrico era a resposta a anos de letargia e vazio. Havia ali
força, paixão, nervo. É verdade que não era um cavalheiro, mas um bom
treinador não tem de ser um mestre do protocolo – ele próprio o
sublinhou, quando confrontado pelos jornalistas com a sua, digamos,
dificuldade ligeira em articular duas frases em português correto.
Joachim
Kugler, psicólogo alemão da Universidade de Ruhr, estudou o
comportamento de treinadores de futebol durante um jogo. E chegou a
conclusões que ajudam a explicar o fenómeno Jesus. Kugler constatou que
no sangue dos treinadores de topo há níveis particularmente elevados de
hidrocortisona, a hormona responsável pelo stresse. O maior pico de
concentração regista-se pouco antes do fim da primeira parte – nessas
alturas atinge valores comparáveis aos de pára-quedistas novatos antes
do seu primeiro salto. A forma como, durante o intervalo, os treinadores
conseguiam gerir a presença intrusiva desta hormona era fundamental
para preparar os jogadores para o que restava do jogo.
Jesus
sabia trabalhar em stresse permanente. E conseguia contaminar os seus
jogadores com essa faculdade. Eles acreditavam - mesmo quando tudo
parecia estar perdido; eles corriam - mesmo quando a bola já não estava
manifestamente ao seu alcance; eles ganhavam - mesmo quando os adeptos
já começavam a abandonar o estádio.
Passados três anos, tudo
mudou. Nas suas míticas flash interviews, Jesus já não diz “hádem” ou
“póssamos”, passou a vestir fatos impecáveis, aprimorou o cabelo,
arranjou os dentes e terá feito, segundo o Correio da Manhã, várias
plásticas à cara e aplicado botox. Aburguesou-se. E, com ele, arrastou a
equipa. Na última terça-feira, quando olhavam para o banco, os
jogadores do Benfica já não viam aquele personagem vibrante que há três
anos lhes gritava furiosamente e os obrigava a correr e a ganhar. No seu
lugar, encontrava-se o novo senhor Jorge, o cavalheiro que um dia, numa
das suas épicas entrevistas, se definiu justificadamente como uma
espécie de Paula Rego do futebol – de facto, o Benfica jogava bonito.
Para grande tristeza dos benfiquistas, desse Jesus resta apenas a sua
inseparável pastilha, porque a pintura, que é o que mais conta, está
irremediavelmente desfeita. Só Luís Filipe Vieira é que ainda não
percebeu."
No que diz respeito ao nosso Benfica, eu não me revejo nas publicções ou comentarios, que são feitas pelo jornal Record.
ResponderEliminarNo entanto reconheço certa, a analise a esta "pastilha" .