Nos últimos tempos, mais concretamente após o recomeço da Liga NOS, tenho reflectido bastante sobre o meu papel aqui no blog. Culminou com uma mensagem aos meus companheiros de escrita em que comunico que vou terminar com a minha participação no Universo Benfiquista. A estima e consideração que tenho pelos três e a forma como conversaram comigo em seguida fez-me repensar a decisão, no entanto não me fez reverter na redefinição do papel que terei por aqui pelo menos nos próximos tempos.
Em primeiro lugar, dizer que esta minha posição em nada tem a ver com a situação actual da equipa. Ou seja, não é por termos maus resultados que me afastarei. Na verdade, comecei a frequentar este blog mais activamente justamente na pior fase de Rui Vitória. E também não é por qualquer mal estar que possam querer incutir entre os escribas deste blog. Curiosamente hoje ninguém ousa referir este blog como Vieirista.
A minha decisão é estrutural e não conjuntural. Não me consigo identificar com nada daquilo que tem ultimamente sido publicado ou comentado no Universo Benfiquista. Mas não só. Não consigo rever-me nesta forma absolutamente absurda de olhar para o desporto e concretamente para o futebol, mas acima de tudo para um clube de futebol. E a verdade é que quando passamos algumas horas da nossa vida e do nosso dia a dar por um local onde nos deixamos de sentir bem, começamos a perceber que algo tem de mudar.
A verdade é que o comum adepto português tem muito a tendência de elogiar o campeonato inglês. De facto, hoje tornou-se algo corriqueiro. O campeonato inglês é o melhor campeonato do Mundo. É lá que estão as melhores equipas. É lá que estão os melhores treinadores. É lá que se joga o melhor futebol do Mundo. Foi lá que se acabou com o flagelo que são as claques e os hooligans. É lá que existe um verdadeiro amor ao futebol. À essência do futebol. Vemos equipas da terceira divisão com estádios de 10 mil adeptos cheios. Vemos a final do playoff de apuramento para a Premier League com 65 mil em Wembley. O português quer o futebol inglês em Portugal, quer a cultura desportiva em Portugal, só que se esquece que há mais na cultura desportiva inglesa que gostar de futebol.
Gostava só de vos deixar alguns números:
Jurgen Klopp - Nos primeiros 3 anos em Liverpool ganhou um total de zero títulos. No quarto ano do seu reinado em Liverpool venceu uma Liga dos Campeões, uma Supertaça Europeia e um Campeonato de Clubes (zero títulos nacionais). No quinto ano venceu o campeonato, foi já afastado da Liga dos Campeões e de todas as taças nacionais. Em cinco anos terá um total de quatro títulos conquistados pelo Liverpool.
Guardiola - Está há 7 anos sem vencer uma competição internacional mesmo tendo tido provavelmente nos últimos 4 anos a equipa mais cara do Mundo.
José Mourinho - Nas últimas 10 épocas venceu 2 campeonatos nacionais e uma Liga Europa. Nas últimas 5 épocas venceu duas taças nacionais em Inglaterra e uma Liga Europa. Nos últimos 3 anos venceu zero títulos.
Estamos a falar possivelmente dos três mais conceituados treinadores do Mundo. Os mais mediáticos certamente. Em Portugal despede-se um treinador que bateu TODOS os recordes que havia para bater durante um ano civil porque nos últimos 12 jogos venceu 2 e eventualmente poderá perder um título de campeão nacional. Em Portugal critica-se uma direcção de um clube e o seu Presidente porque em Janeiro não dotou a equipa de jogadores de qualidade quando até dia 8 de Fevereiro (depois do fecho do mercado de Janeiro) a equipa do Benfica de Bruno Lage tinha o seguinte registo:
Em 34 jogos oficiais desta temporada tinha 26 vitórias, 4 empates e 4 derrotas. Em 19 jogos do campeonato tinha 18 vitórias e 1 derrota, com 7 pontos de avanço sobre o segundo classificado. Nos 38 jogos de campeonato antes de 8 de Fevereiro de 2020 o Benfica de Lage teve 36 vitórias, 1 empate e 1 derrota. 18 vitórias consecutivas fora de casa, incluindo no Dragão, 2 vezes em Alvalade, 2 vezes em Braga e 2 vezes em Guimarães. É só 95% de vitórias.
Esta equipa, com Bruno Lage, antes de 8 de Fevereiro tinha 63 jogos oficiais com 49 vitórias, 6 empates e 8 derrotas. São 78% de vitórias em todas as competições. Nas competições nacionais tinham 88% de vitórias, com 45 vitórias em 51 jogos.
Em Portugal os adeptos acham que num mercado de Inverno duma época em que a equipa apenas foi eliminada duma Taça da Liga, que ninguém lhe interessa a não ser quando a ganham, e sem derrotas, que deveriam ser feitos investimentos duma mão cheia de jogadores. Podemos sempre concordar que o clube poderia ter comprado um ou outro jogador. Podemos sempre discordar com esta ou aquela contratação. Não me revejo numa cultura desportiva que perante um cenário de quase 80% de vitórias em todas as competições, perante 88% de vitórias nas competições nacionais, com a Taça de Portugal para vencer e com 7 pontos de avanço sobre o segundo tenhamos constantemente críticas para cima de uma direcção, de um treinador ou de vários jogadores. É insuportável assistir a isto. É verdadeiramente deprimente.
Passámos as últimas três temporadas com um treinador acima dos treinador do Benfica. Jorge Jesus. Bruno Lage infelizmente num momento de completo descontrolo face aos acontecimentos vomitou algo que todos sabemos ser verdade mas que ele enquanto treinador do Benfica não pode dizer. Há muita comunicação social amiga de Jorge Jesus que mina o trabalho dos treinadores do Benfica para que seja sempre uma possibilidade. E portanto, se Bruno Lage já estava diminuído face à inexistência de cultura desportiva em Portugal, a comunicação social matou o treinador do Benfica. Digo que não acredito que Jorge Jesus volte ao Benfica. Digo que o Presidente do Clube sabe bem que isso não é solução e tenho perfeita convicção que tudo o que tem saído a público é plantado não pelo Benfica mas sim pelo JJ e seus amigos.
Jorge Jesus que em Portugal nos três anos depois de ter saído do Benfica venceu uma Supertaça e uma Taça da Liga com o Sporting mais gastador dos últimos anos. Jorge Jesus que no Benfica, depois de um ano de estreia com a vitória no campeonato, nos três anos seguintes venceu DUAS Taças da Liga. Foi esse o seu pecúlio no que a troféus diz respeito. E que em 6 anos só por uma vez passou da fase de grupos da Liga dos Campeões. Acho que todos concordamos que tinha uma equipa com muito mais estrelas que hoje temos. E ao contrário do que muito se afirma por aí, o Benfica de Jorge Jesus só foi máquina de triturar no primeiro ano.
Sou de facto alguém que não consegue olhar nem se rever nesta forma de viver o clube e o desporto. O treinador do Benfica é alguém extremamente competente. Estou bem à vontade para o elogiar quando fui o primeiro a dizer que não concordava em nada com a saída de Rui Vitória. E quando fui dos primeiros a criticar abertamente as suas prestações em diversos jogos, como em Leipzig. Há uma linha enorme que separa a critica momentânea à exigência dum despedimento. Despedimento esse a poucas jornadas do fim do campeonato e depois de tudo aquilo que Bruno Lage fez ao serviço do clube.
Sou de facto alguém que não consegue olhar nem se rever nesta forma de viver o clube e o desporto. Estamos no país que um Presidente do Clube que pegou no Benfica no ponto mais baixo da história do clube a todos os níveis, desportivos, financeiros e patrimoniais e que desde que pegou no clube tem apenas 2 títulos a menos (24 vs 22) que o clube com mais títulos no futebol nacional durante esses 15 anos. Todos nós sabemos como muitos destes 24 títulos foram conseguidos, mas esse facto só interessa quando somos roubados, quando é para criticar o Presidente do Clube não interessa o facto de com alguma imparcialidade por parte do Sistema montado em Portugal, o Benfica de Luís Filipe Vieira era o clube com mais títulos de Portugal mesmo tendo em conta o ponto de partida dos dois clubes em 2004.
O Benfica neste momento é o clube com mais títulos dos últimos 10 anos. Em futebol e na soma de todas as modalidades. Títulos nacionais ou títulos internacionais. É o clube com o maior património em Portugal, sendo reconhecido nacionalmente e internacionalmente a excelência das suas instalações e da sua formação. Não é apenas o clube com os melhores resultados desportivos e patrimoniais, é também o clube com não só a melhor situação financeira, como nos últimos 7 anos tem tido lucro nos exercícios financeiros. É um clube com uma dívida bancária e uma exposição à banca residual, com um passivo muito reduzido face aos seus activos e é a única SAD portuguesa com os capitais próprios superiores aos capitais sociais. O Benfica neste momento só não compete de igual para igual com os grandes do futebol mundial porque se encontra num país com uma visibilidade reduzida, num pequeno mercado e que garante um valor baixíssimo de receitas televisivas quando comparadas com as grandes ligas da Europa.
Não me revejo numa crítica infundada e sem nada a sustenta-la. Num desporto saudável é raro vencer sempre o mesmo. Quando isso acontece o sinal só pode ser de alarme. Nem o Benfica de Eusébio vencia sempre. Todos nós aqui sabemos que o desporto em Portugal é tudo menos saudável, no entanto exigimos aos nossos que vençam sempre. Não se enganem, sofro tanto pelo Benfica como qualquer um de vocês, mas não me consigo ver a debater e discutir futebol com pessoas que acham que o futebol é o momento. Aquele lugar comum jornalístico do mais baixo que há. Como se nada do que foi feito anteriormente interessasse e a única coisa que contasse é o último resultado, a última exibição.
Para o Liverpool e Jurgen Klopp valeu a pena esperar pelo final do quarto ano para vencer a Liga dos Campeões e pelo final do quinto ano para vencer a Liga. Para o Benfica e Bruno Lage chegar ao final da época com uma Supertaça, uma Liga e uma Taça de Portugal não é suficiente. Já está despedido. Para Luís Filipe Vieira não basta que nos últimos 10 anos o Benfica tenha vencido 18 troféus nacionais e ter ido a duas finais europeias. Não basta no mandato que este ano encerra ter vencido 8 troféus nacionais em 12, para muitos já vai embora tarde. É esta a cultura desportiva em Portugal e ao que parece é isto que muitos se orgulham de constantemente comentar por estes blogs e por estas redes sociais fora. Com mais ou menos eloquência nas palavras que muitos têm, os dados são estes.
Pela primeira vez na História do Sport Lisboa e Benfica um Orçamento do Clube é chumbado numa Assembleia Geral. Num ano de pandemia e indefinição face a tudo o que é orçamento é um sinal do que aí poderá vir. Hoje, aqueles que no dia da votação desconfiavam do voto electrónico, congratulam-se pelos resultados.
Eu não me revejo nisto. Este não é o meu Benfica.
Eu acredito nestes jogadores, eu acredito neste treinador, eu acredito neste Benfica.
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